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Sarcopenia: definição, diagnóstico e manejo terapêutico

Pós UTI
Reabilitação
Reabilitação Intensiva
Recife

Assinado por Francimar Ferrari, Coordenador de Reabilitação da Clínica Florence, artigo explica a sarcopenia e como cuidar da síndrome no pós alta hospitalar.

Teste de força muscular realizado pelo fisioterapeuta identifica a sarcopenia na Clínica Florence.
Teste de força muscular realizado pelo fisioterapeuta com o uso de dinamômetro colabora para a identificação da sarcopenia e para o tratamento assertivo.

Artigo por Francimar Ferrari – A sarcopenia [do grego carne (sarx) e perda (penia)] é uma condição clínica caracterizada pela perda de massa e função do músculo esquelético. É um quadro cuja diminuição da massa muscular esquelética pode levar ao declínio na capacidade física e, embora seja uma doença (síndrome) que acontece principalmente em idosos, o seu desenvolvimento pode estar associado a condições de saúde não exclusivas de pessoas com idade mais avançada. Esta síndrome, progressiva e generalizada, está intrinsecamente relacionada com incapacidade física, baixa qualidade de vida e morte. 

A origem da sarcopenia é multifatorial e seu significado clínico, embora universalmente reconhecido, não é universalmente aceito. De acordo com artigo do Grupo de Trabalho Europeu sobre Sarcopenia em Pessoas Idosas (EWGSOP), publicado na Oxford Academic, a sarcopenia requer a presença de baixa massa muscular e baixa função muscular. O grupo define a sarcopenia como uma síndrome relacionada à idade, caracterizada por uma perda progressiva e generalizada de massa e força muscular esquelética, com efeitos adversos à saúde humana.

Em geral, o quadro clínico de perda de massa e função do músculo esquelético tem forte associação com o aumento da gordura corporal, de modo que uma fraqueza acentuada possa acontecer mesmo em pessoas com peso normal, sendo esta condição chamada obesidade sarcopênica, diagnóstico que pode trazer importantes prejuízos na saúde metabólica e cardiovascular da pessoa acometida. A diminuição da massa muscular também tem associação direta com a diminuição da densidade óssea e a ocorrência concomitante de osteoporose é frequentemente identificada quando avaliada e examinada por especialistas.

A junção da sarcopenia com osteoporose, ambas condições clínicas progressivas, a chamada osteosarcopenia, potencializa o declínio na funcionalidade de idosos e aumenta sensivelmente o risco de quedas e fraturas, com destaque a Fratura de Quadril e Fratura de Fêmur. Estes eventos graves são responsáveis por mudanças significativas na vida das pessoas acidentadas, com limitantes prejuízos na saúde funcional e qualidade de vida, bem como promoverem um grande impacto na saúde pública, com graves consequências médicas e socioeconômicas.

Um dado interessante é que se estima que a osteosarcopenia deverá ser responsável por mais de 3 milhões de incidentes de fraturas até 2025. Os gastos com internações e tratamentos de sequelas de fraturas em idosos se traduzem em quase US$ 25,3 milhões por ano nos EUA.

A prevalência da síndrome clínica de diminuição do músculo e força varia entre diferentes populações, com taxas relatadas de 5–50% em pessoas com mais de 65 anos de idade. Essas variações dependem de fatores como as técnicas específicas utilizadas para medição de massa muscular e sua função, a população em estudo e os critérios diagnósticos. Porém, em geral, a sarcopenia aparece em 5–13% na sétima década de vida e pode aumentar até 11–50% aos 80 anos. Além disso, é previsto que a sarcopenia afetará mais de 500 milhões de idosos até 2050.

O diagnóstico é essencialmente funcional e leva em consideração a existência de prejuízos em três marcadores objetivos: redução de força, prejuízo na performance física e evidência de massa muscular reduzida.

Os marcadores de força muscular e performance física podem ser avaliados a partir de medidas da força de preensão palmar e testes funcionais de velocidade de marcha. Já a redução da massa muscular pode ser avaliada por exames de avaliação da composição corporal, como uma simples bioimpedância, ou por um exame mais preciso e acurado como DXA (raio-x de dupla energia), mesma tecnologia que avalia a densidade óssea. É importante ressaltar que, na impossibilidade da realização de exames de composição corporal, a verificação de prejuízos na performance física e força muscular já são suficientes para o diagnóstico clínico-funcional da sarcopenia.

Como abordado, a sarcopenia é um fenômeno multifatorial que resulta de uma interação complexa entre fatores biológicos, genéticos, nutricionais, hormonais e de estilo de vida e entre estes fatores de risco podemos destacar o envelhecimento, sexo e nível de atividade física. Porém pacientes com outras condições clínicas associadas a ocorrência como doenças crônico degenerativas, reumáticas, osteoarticulares, neurológicas, cardiovasculares, pulmonares e metabólicas podem acelerar sensivelmente a sua gênese e agravar a saúde e bem-estar físico, psíquico social da pessoa.

Pacientes hospitalizados, em internações prolongadas ou Pós UTI, por exemplo, muitas vezes enfrentam condições clínicas que podem contribuir para o desenvolvimento ou agravamento da síndrome, pois são frequentemente expostos que a fatores que convergem para perda de massa muscular como cirurgias, repouso prolongado no leito e inatividade física, desnutrição, inflamação sistêmica, exposição a fármacos e outros fatores catabólicos que agridem o tecido neuromuscular. Sendo assim, os pacientes hospitalizados estão em um risco aumentado de desenvolver sarcopenia ou de agravar a condição, caso já estiverem enfrentando a síndrome.

Portanto, é crucial que os profissionais de saúde adotem abordagens preventivas e intervencionistas para preservar a massa muscular e a função em pacientes, em especial os idosos, na transição de cuidados, desde o período de hospitalização e ao pós alta hospitalar, antes do retorno do paciente ao domicílio.

Os cuidados pós alta hospitalar para pessoas sarcopênicas podem envolver estratégias interdisciplinares, como a promoção da mobilidade precoce, a monitorização da ingestão alimentar e nutricional, a prescrição de exercícios leves e a otimização do manejo médico para minimizar o impacto negativo do período de internamento na saúde muscular.

Existe uma intrínseca e forte correlação entre a inatividade física e as perdas de massa e força muscular e, portanto, a prática regular da atividade física se apresenta com um poderoso fator de proteção para a prevenção e para o tratamento da sarcopenia. Além disso, um outro passo importante a ser dado para uma pessoa com fragilidade clínica é garantir que o paciente esteja recebendo nutrição correta e suficiente. 

A ocorrência de sarcopenia tem um grave efeito negativo na sobrevivência da pessoa, sendo muito importante prevenir ou adiar o máximo possível o início dessa condição. Assim, aumentar a sobrevida e/ou reduzir a demanda por cuidados de longo prazo, sendo benéfica, para algumas pessoas, a indicação de um programa de Reabilitação Intensiva e multiprofissional.

No plano de cuidados de Reabilitação Intensiva, as intervenções da fisioterapia para cuidar de pacientes com este diagnóstico podem ser desenvolvidas com mais atenção aos exercícios físicos (principalmente os exercícios resistidos), além de contar com o apoio essencial das dos nutricionistas e da terapia ocupacional para cuidados assertivos. 

Sendo assim, uma parceria bem estruturada e devidamente alinhada entre a equipe interdisciplinar tem papel fundamental no manejo adequado da pessoa sarcopênica na transição de cuidados.

Francimar Ferrari, Coordenador de Reabilitação na Unidade Recife da Clínica Florence
Coordenador de Reabilitação da Unidade Recife da Clínica Florence, Francimar Ferrari é fisioterapeuta, Mestre em Ciências Biológicas (Fisiologia) pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Doutor em Ciências Pneumológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).